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segunda-feira, 18 de abril de 2011

RECURSOS DA NARRATIVA EM CLARICE LISPECTOR

        
Paraguassu de Fátima Rocha



FLUXO DE CONSCIÊNCIA E MONÓLOGO INTERIOR

Fluxo de consciência: é a expressão direta dos estados mentais, mas desarticulada, em que se perde a sequência lógica e onde parece manifestar-se diretamente o inconsciente.

 ...estou procurando, estou procurando. Estou tentando entender Tentando dar a alguém o que vivi e não sei a quem, mas não quem ficar como que vivi. Não sei o que fazer do que vivi, tenho medo dessa desorganização profunda. Não confio ‘lo que me aconteceu. Aconteceu-me alguma coisa que eu, pelo fato de não a saber como viver, vivi uma outra? A isso quereria chamar desorganização, e teria a segurança de me aventurar, porque saberia depois para onde voltar: para a organização anterior A isso prefiro chamar desorganização pois não quero não me confirmar no que vivi na confirmação de mim eu perderia o mundo como eu o tinha, e sei que não tenho capacidade para outro. (A paixão segundo G.H)

Monólogo interior: implica num aprofundamento maior dos processos mentais da personagem em que essa se revela de dentro para fora, numa total desarticulação com o real.

- monólogo interior direto: a personagem expõe os recantos da sua mente numa espécie de confidência ao leitor, emprega a primeira pessoa do singular, e o tempo verbal é o presente.


A cama desaparece aos poucos, as paredes do aposento se afastam, tombam vencidas. E eu estou no mundo solta e fina como uma corça na planície. Levanto-me suave como um sopro, ergo minha cabeça de mundo, do tempo,  de Deus. Mergulho e depois emerjo, como de nuvens, das terras ainda não possíveis, ah, ainda não possíveis. Daquelas que eu não soube ainda imaginar, mas que brotarão. Ando, deslizo, continuo, continuo... Sempre  sem parar, distraindo minha sede cansada de pousar num fim [...] – Estou me enganando preciso voltar. Não sinto loucura no desejo de morder estrelas, mas ainda existe a terra... (Perto do coração selvagem)

- monólogo interior indireto: emprega a terceira pessoa do singular e o tempo verbal predominante é o passado.


“De manhã. Onde estivera alguma vez, em que terra estranha e milagrosa já pousara para agora sentir-lhe o perfume? Folhas secas sobre a terra úmida. O coração apertou-se-lhe devagar, abriu-se, ela não respirou um momento esperando... Era de manhã, sabia que era de manhã... recuando como pela mão frágil de uma criança, ouviu abafado como em sonho, galinhas arranhando a janela". (Perto do coração selvagem)

METALINGUAGEM:

A transformação do ato criador no tema da criação, artifício presente, sobretudo, na arte moderna no cinema, no teatro, nas artes plásticas, enfim, em toda manifestação artística que se debruça sobre o próprio fazer.

Vai ser difícil escrever essa história. Apesar de eu não ter nada a ver com a moça, terei que me escrever todo através dela por entre espantos meus. (A hora da estrela)

EPIFANIA:

Segundo Massaud Moisés, é “o instante existencial no qual o personagem é acometido por uma súbita revelação interior que dura um segundo fugaz como a iluminação instantânea de um farol nas trevas”.


Ela apaziguara tão bem a vida, cuidara tanto para que esta não explodisse. Mantinha tudo em serena compreensão, separava uma pessoa das outras, as roupas eram claramente feitas para serem usadas e podia-se escolher pelo jornal o filme da noite – tudo feito de modo a que um dia se seguisse ao outro. E um cego mascando goma despedaçava tudo isso. E através da piedade aparecia a Ana uma vida cheia de náusea doce, até a boca. (Amor. In: Laços de família)


Referências:
LISPECTOR, Clarice. A Hora da Estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.
­­______. A Paixão Segundo G. H. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.
______. Laços de Família. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.
______. Perto do coração selvagem. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.
MOISÉS, Massaud. Dicionário de Termos Literários. São Paulo: Cultrix, 2004.
SCRIPTA UNIANDRADE. Revista da pós-graduação em Letras. No. 3.

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